Após a criação de grupos especiais para investigar e buscar a reparação pelos danos dos ataques às sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro, ao menos 254 apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foram acionados criminalmente na Justiça pelo Ministério Público Federal.
Já na seara civil, a lista inclui 134 pessoas, cinco empresas e duas entidades processadas pela AGU (Advocacia-Geral da República) para que arquem com os prejuízos causados em razão da depredação e do vandalismo contra o patrimônio público.
Esses grupos são espécies de forças-tarefas que estão atuando nos casos e foram instituídos dias após a depredação. O chefe do MPF (Ministério Público Federal), Augusto Aras, é crítico do modelo, notabilizado principalmente pela Operação Lava Jato. Na gestão Aras, as forças-tarefa foram desmontadas.
O volume mais expressivo de denúncias formalizadas até o momento pela PGR (Procuradoria-Geral da República) mirou pessoas presas pela polícia no acampamento em frente ao quartel-general do Exército, na manhã seguinte aos ataques.
O órgão enviou ao STF (Supremo Tribunal Federal) pedidos de abertura de ação penal contra 204 bolsonaristas que estavam no local, sob a acusação de associação criminosa e de que eles incitaram as Forças Armadas contra os Poderes.
Outras 49 pessoas foram denunciadas por participar da invasão e depredação nos edifícios do Congresso, do Planalto e do STF; e deverão responder, entre outros, a acusações de crimes de golpe de Estado, tentativa de abolir o Estado democrático de Direito e dano ao patrimônio público.
O trabalho na PGR está a cargo de um grupo coordenado pelo subprocurador Carlos Frederico Santos, designado por Aras para a missão.
Em meio ao pacote de denúncias, a Procuradoria propôs novas diligências ao Supremo. As apurações no tribunal tramitam sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes.
Internamente, o STF ainda discute se todos os processos devem ser julgados na própria corte até o fim ou se serão encaminhados para análise de instâncias inferiores.
As diligências propostas pela PGR visam delimitar outras condutas criminosas de quem foi preso e está formalmente acusado, além de identificar outros envolvidos para além da lista de detidos —1.384 no total, segundo o balanço do sistema penitenciário do Distrito Federal.
Os investigadores organizaram a apuração em quatro núcleos: instigadores e autores intelectuais; financiadores; autoridades responsáveis por omissão indevida; e executores dos atos. As denúncias enviadas pela Procuradoria ao Supremo envolvem pessoas do quarto grupo.
Os investigadores analisam laudos periciais, imagens, dados de geolocalização e depoimentos de envolvidos e testemunhas.
Parte do trabalho é realizado por um grupo criado no âmbito da SPPEA (Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise), estrutura vinculada ao gabinete de Aras. O trabalho envolve 15 membros e servidores do MPF.
A SPPEA é responsável pela elaboração de perícias, levantamento de dados, captura e análise de provas digitais úteis às investigações e processos judiciais conduzidos pelos procuradores de todo o país. Atuou, por exemplo, em apurações da Lava Jato.
A criação do grupo de trabalho foi necessária dado o grande volume de relatórios de pesquisa e informação a ser produzido, informou a PGR à Folha.
Há uma preocupação por parte de procuradores da República em garantir a validade das evidências coletadas, antecipando-se a eventuais questionamentos na Justiça.
Um episódio anterior ao 8 de janeiro também motivou uma denúncia contra três bolsonaristas. O Ministério Público do Distrito Federal denunciou o trio pela tentativa de explosão de um caminhão com combustível nos arredores do aeroporto de Brasília, em 24 de dezembro.
Foram denunciados Alan Diego dos Santos, George Washington de Oliveira Sousa e Wellington Macedo de Souza, este último está foragido e os outros dois foram presos pela Polícia Civil. A Procuradoria da República no Distrito Federal analisará o caso para eventual enquadramento penal em crimes de competência federal.
Além dos atos de 8 de janeiro e 24 de dezembro, apurações prosseguem para identificar e delimitar a participação de apoiadores do ex-presidente na tentativa de invasão à sede da Polícia Federal após a prisão do indígena bolsonarista José Acácio Serere Xavante.
O caso ocorreu no dia 12 de dezembro, data da diplomação de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Tribunal Superior Eleitoral. A prisão de Serere foi determinada por Moraes a pedido da PGR, que apontou o indígena como um dos integrantes de atos antidemocráticos na capital.
No âmbito da AGU, órgão que faz a representação jurídica do governo federal, foram apresentadas três ações com o objetivo de ressarcir os cofres públicos pelos danos causados nos ataques.
A AGU tem informado que, até agora, esse prejuízo é estimado pelos Três Poderes em R$ 18,5 milhões, mas esse valor ainda pode ser excedido. O advogado-geral da União, Jorge Messias, também afirma que poderá ajuizar ações por dano moral coletivo contra os golpistas.
As pessoas e empresas processadas pelo órgão são suspeitas de financiar o fretamento de ônibus para os atos golpistas e por participar da depredação dos prédios públicos.
Na sexta-feira (27), a AGU informou que uma nova ação cautelar foi apresentada com pedido de bloqueio de bens de 42 pessoas físicas presas em flagrante no dia dos ataques antidemocráticos em Brasília, em 8 de janeiro.
ACUSAÇÕES ENVIADAS À JUSTIÇA
MINISTÉRIO PÚBLICO DO DF
- Ato: Tentativa de explodir uma bomba perto do aeroporto de Brasília
- 3 pessoas denunciadas
- Acusação: crime de explosão, quando se expõe “a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem, mediante explosão, arremesso ou simples colocação de engenho de dinamite ou de substância de efeitos análogos”.
PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA (PGR)
- Ato: Invasão e depredação das sedes do Três Poderes
49 pessoas denunciadas
Acusação: Abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano qualificado ao patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado e associação criminosa - Ato: Acampamento no QG do Exército
204 pessoas denunciadas
Acusação: Incitação ao crime equiparada pela animosidade das Forças Armadas contra os Poderes Constitucionais e associação criminosa - Denúncia sem exposição de detalhes
1 pessoa denunciada
ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
- Ação civil por danos ao patrimônio
Alvos: 134 pessoas, 5 empresas e 2 entidades
Acusação: Ações na Justiça Federal do DF pedem o bloqueio de bens de envolvidos nos atos de invasão e depredação das sedes dos três Poderes. O valor total dos pedidos é de R$ 18,5 milhões, estimativa dos danos ao Palácio do Planalto, ao Supremo Tribunal Federal, ao Senado e à Câmara