Guilherme Boulos (PSOL), Ricardo Nunes (MDB) e Tabata Amaral (PSB) adotaram estratégias diferentes nas discussões sobre a vaga de vice na corrida à Prefeitura de São Paulo, mas convergiram na avaliação de que o posto ajuda a formatar a imagem da candidatura e pode ser útil em negociações partidárias.
Dos três pré-candidatos, Boulos é o que tem a situação mais consolidada, com a escolha já encaminhada de Marta Suplicy (PT), por decisão do presidente Lula (PT). Atuando como uma espécie de avalista e contraponto à inexperiência do deputado federal no Executivo, a ex-prefeita tem modulado sua participação por entender que é o titular quem precisa aparecer.
Nunes, por outro lado, é o que está rodeado de mais especulações em relação a quem o acompanhará na tentativa de reeleição. A necessidade de contemplar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sem melindrar outros políticos e partidos da coligação deixou o prefeito cercado de potenciais vices. Ele vem usando a situação para testar a viabilidade dos nomes e administrar as pressões.
Tabata atraiu para a pré-campanha o apresentador José Luiz Datena, que se filiou ao PSB e figura como plano A para vice —embora o discurso oficial seja o de que nada está fechado. Enquanto a popularidade do jornalista a ajuda a alavancar seu projeto, a deputada federal evita cravar o nome dele e prospecta aliança com partidos como o PSDB, ao qual poderia ceder o espaço para romper o isolamento.
A sete meses das eleições, os três pré-candidatos mais bem colocados nas pesquisas têm desafios que podem ser ilustrados pelas discussões sobre vices. A regra geral é a de que os companheiros de chapa, se não chegam a ser decisivos para uma vitória, podem se tornar um problema caso criem ruídos.
No caso de Boulos, a relação com Marta tem sido construída com entrosamento e respeito, de acordo com interlocutores de ambos. O primeiro ato de rua dos dois, no último dia 22, em Parelheiros (extremo sul da capital), deu mostras do papel que a ex-prefeita busca desempenhar, o de alguém que não pretende ofuscar o cabeça da chapa.
Resgatada pelo PT por causa da memória popular em torno de seu governo (2001-2004), Marta fez um discurso curto durante o dia de atividades na região —onde ainda conserva apoio por causa de realizações de sua gestão— e não vocalizou críticas a Nunes, de quem era secretária até dezembro.
Marta decidiu não conceder entrevistas desde que rompeu com o emedebista para voltar a seu antigo partido e, segundo assessores, só deve avaliar pedidos no segundo semestre. Com isso, ela se poupa de ter que explicar a guinada para o campo rival e o passado de rusgas com o PT, sigla que deixou em 2015.
Estrategistas de Boulos pretendem explorar, além da experiência administrativa, a conexão da ex-prefeita com a periferia e o trânsito dela em segmentos da elite e setores que não necessariamente aceitariam dialogar com o deputado e líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto).
Marta vem indicando que aceitou a missão para combater o bolsonarismo na capital, com uma eventual reeleição de Nunes, e para fortalecer um dos poucos líderes que a esquerda produziu nos últimos anos. O discurso gira em torno da ideia de uma passagem de bastão geracional. Na filiação ao PT, ao lado de Lula, a ex-prefeita usou a narrativa de “volta para casa” e exaltou seus laços com a legenda.
Marta usou como argumento para se demitir da Secretaria de Relações Internacionais a aproximação de Nunes com Bolsonaro, a quem se opõe —ela fez campanha por Lula em 2022 e se recusou a estar no mesmo palanque do ex-mandatário na eleição deste ano.
A aliança com Bolsonaro, que brecou o lançamento de uma candidatura mais à direita que acabasse por dividir o eleitorado antipetista, cobra de Nunes concessões ao grupo do ex-presidente.
O presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, apresentou ao emedebista quatro sugestões de nomes para vice, um deles o coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo Ricardo Mello Araújo —cuja indicação é a favorita de Bolsonaro. O nome do ex-comandante da Rota (batalhão de elite da PM também conhecido pelo alto grau de letalidade e relatos de violência policial), porém, enfrenta resistências.
No mês passado, Nunes levou a eventos a delegada Raquel Gallinati, indicada por uma ala do PL. Ela poderia, assim como Mello Araújo, embutir na candidatura um aceno a medidas na área de segurança pública, já que a insegurança caminha para ser tema relevante nos debates eleitorais.
Cobiçada, a vaga na candidatura à reeleição tem outros interessados, como o presidente da Câmara Municipal, Milton Leite (União Brasil), e o Republicanos, partido do governador Tarcísio de Freitas. No caso de Leite, seria preciso antes liquidar a pré-candidatura do deputado federal Kim Kataguiri, líder do MBL (Movimento Brasil Livre) que se articula para emplacar um voo solo pela União.
Tentando ganhar tempo e evitar desembarques, Nunes sustenta o discurso de que a definição só será feita mais adiante, após consulta aos partidos da futura coligação.
Empurrar a definição para agosto, limite do prazo legal para o registro das candidaturas, também é algo que está por trás da movimentação de Tabata em relação ao nome do vice. Nem ela nem Datena confirmam que o apresentador será sacramentado caso o cenário atual, sem aliança com outro partido, seja mantido —mas a tendência é essa, pelo que foi apalavrado nos bastidores. A decisão estará nas mãos do jornalista.
Datena cumpre até aqui a função de ajudar a popularizar o nome da deputada, que tem taxas de conhecimento baixas para os níveis de um postulante a prefeito de São Paulo. Segundo pesquisa Datafolha do ano passado, 50% dos moradores da capital dizem não conhecê-la.
Auxiliares de Tabata dizem que a associação dela com o do apresentador do “Brasil Urgente”, programa da Band, gerou aumento de interesse pelo nome dela. A avaliação é que a dobradinha ajuda a parlamentar a romper bolhas e favorecer a entrada nas classes C, D e E, além de territórios periféricos.
Um dos temores é que Tabata fique espremida entre Nunes e Boulos quando começar a propaganda oficial de rádio e TV, já que os dois terão tempos maiores. Com a meta de elevar seus percentuais de conhecimento, ela tem apostado em aparições na mídia e entrevistas, além de suas redes sociais.
A pré-campanha comemorou dados recentes que indicaram crescimento consistente no número de seguidores dela. No Instagram, segundo números computados pela equipe, Tabata ganhou 96 mil seguidores em fevereiro, atingindo um total de 1,1 milhão —Boulos possui 2,2 milhões e Nunes, 661 mil.