Maioria dos estados que adota câmeras corporais nas polícias usa gravação ininterrupta, aponta levantamento da USP


Novo edital lançado pelo governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) para compra de equipamentos em São Paulo prevê que o policial poderá escolher o que gravar. Governo Federal deve lançar diretrizes nacionais sobre o tema na próxima terça-feira (28). Câmera corporal em uniforme de policial militar do estado de São Paulo.
Divulgação/Secom/GESP
A maioria dos estados que adota câmeras corporais na Polícia Militar determina a gravação ininterrupta das imagens nas fardas dos agentes, mostra levantamento do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP) obtido com exclusividade pelo g1.
Na quarta-feira (22), o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) lançou um novo edital para aquisição equipamentos em São Paulo. O documento muda a forma de acionamento das câmeras, que deixa de ser ininterrupta para ser realizada de forma intencional pelo policial. Ou seja, o agente agora poderá escolher se grava ou não uma ocorrência.
A mudança foi criticada por entidades de segurança pública e direitos humanos, que apontam que a gravação de todo o turno tem garantido a redução da letalidade policial e do uso da força de forma indiscriminada durante abordagens, além de oferecer proteção jurídica e física aos próprios policiais.
Segundo o levantamento do NEV-USP — feito com informações colhidas por meio da Lei de Acesso à Informação, Diário Oficial e reportagens publicadas até esta sexta-feira (24) —, os seguintes estados adotam o modelo de gravação ininterrupta:
Bahia,
Minas Gerais,
Pará,
Paraná,
Pernambuco ,
Rio de Janeiro,
Roraima.
Nos estados do Ceará e Espírito Santo, as câmeras são utilizadas apenas pela Polícia Penal, e não pela PM.
Já em Santa Catarina e Rio Grande do Norte, a câmera é acionada apenas durante as ocorrências, assim como o novo modelo que será adotado em São Paulo.
Segundo o pesquisador do NEV-USP Daniel Edler, o modelo anterior de gravação ininterrupta adotado em São Paulo serviu como referência para diversos estados.
“Tem policiais do país inteiro indo para São Paulo. O próprio Ministério da Justiça, quando foi criar sua nota técnica sobre as câmeras corporais, se valeu muito da experiência de São Paulo. Acabou sendo talvez o maior caso de sucesso do Brasil, que virou de fato uma grande influência para as outras polícias.”
“Apesar de [São Paulo] não ter sido o primeiro estado a implementar as câmeras, foi o primeiro que conseguiu implementar a partir de um estudo de avaliação muito bem feito e muito bem detalhado. Se olhar para os dados de redução do uso da força, da força letal, por exemplo, caiu 57% em São Paulo. Se você olhar a redução de agressão, caiu 63% em São Paulo”, disse.
Os estados do Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Sul, Sergipe e Tocantins ainda não têm sistema de câmeras corporais em funcionamento.
Ao g1, a Polícia Militar de Rondônia informou que utiliza câmeras individuais, mas não forneceu detalhes sobre a quantidade, modo de acionamento ou tipo de gravação feitos pelos equipamentos. O órgão informou que a “utilização está fixada em Procedimento Operacional Padrão, que é classificado como secreto”.
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Protocolo nacional para uso de câmeras
Em agosto de 2023, o Ministério da Justiça começou a elaborar um protocolo nacional para padronizar as regras sobre o uso de câmeras nos uniformes dos policiais militares.
Segundo apuração do blog da Andréia Sadi, o governo federal deve anunciar na próxima terça-feira (28) o documento final com as diretrizes para os agentes de segurança, dias após a publicação do novo edital do governo Tarcísio de Freitas.
O ministério avalia que há evidências científicas de que câmeras corporais reduzem o uso de força e as reclamações relativas à conduta do policial, e deve levar em consideração a adoção da política pelos estados para definir repasses de recursos dos fundos Nacional de Segurança Pública e Penitenciário Nacional.
Questionada sobre a mudança, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP) afirmou que “as avaliações apontaram a maior incidência de problemas de autonomia de bateria nos equipamentos de gravação ininterrupta, bem como a elevação dos custos de armazenamento, vez que parte expressiva do material captado não é aproveitada. Tais condições inviabilizavam a expansão do sistema”.
A gestão Tarcísio também alega que o equipamento será mais moderno e tecnológico do que o que está em uso, com capacidade para identificar foragidos e placas de veículos roubados ou furtados.
A gestão diz ainda que haverá a possibilidade de compartilhar os registros de áudio e vídeo automaticamente com o Ministério Público, o Poder Judiciário e demais órgãos de controle, seguindo as regras estabelecidas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
*Colaboram na produção desta reportagem: Cau Rodrigues, Camila da Silva, Claudia Pontes, Grace Vasconcelos, Isabela Leite, Joelma Gonçalves, João Souza, Lívia Machado, Patrício Reis, Thais Pimentel, Vivi Leão, Yuri Marcel.

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