Entenda a vantagem em quitar a taxa de IPTU Muitas vezes somos ludibriados por “contas rápidas” que o nosso cérebro teima em fazer.
Suponha que você viva em um país distante e resolva comprar uma TV supermoderna, cujo preço normal é R$ 10.000,00. O vendedor te oferece duas possibilidades:
- a)Pagar este valor no cartão, a debitar apenas em um ano daqui para a frente; ou
- b)Pagar à vista com 25% de desconto.
Para você tomar a melhor decisão sob o ponto de vista financeiro é preciso comparar a taxa embutida no desconto acima para pagamento à vista com uma taxa de referência, um conceito conhecido em finanças que atende pela expressão “custo de oportunidade” (para saber mais a respeito, leia este artigo que escrevi). Por exemplo, se você tiver dívidas que podem ser quitadas, o custo dessa dívida passa a ser a sua taxa de referência. Se você não possui dívidas, a taxa que aquele dinheiro poderia ser investido sem risco passa a ser sua referência de comparação. Suponha que nesse país distante, você consiga investir seu dinheiro sem riscos a 30% por um ano, livre de impostos.
E aí, qual a melhor opção? O ponto aqui é que muitas vezes nosso cérebro tenta nos responder a essa questão com “contas” muito simples que acabam por nos ludibriar. Nesse caso, muitos podem achar que o desconto de 25% não é suficiente para fazer-me comprar a TV à vista porque eu consigo investir aquele dinheiro a 30% de juros. A “conta rápida” que nosso cérebro faz é simplesmente perceber que 30% é maior que 25%. Mas isso está errado.
O erro consiste em comparar uma taxa de desconto com uma taxa de investimento. É como comparar banana com maçã. Para que a comparação fique correta é preciso transformar a taxa de 25% de desconto em uma taxa de investimento e, aí sim, comparar com os 30%. Para fazer isso, note que a TV custaria hoje R$ 7.500,00 (R$ 10.000 com 25% de desconto, ou seja, com R$ 2.500 de desconto). Você tem então a possibilidade de pagar hoje R$ 7.500 ou R$ 10.000 em um ano. Note que para R$ 7.500 se transformar em R$ 10.000, há necessidade de um aumento de 33,3% (um terço de R$ 7.500 resulta em R$ 2.500, exatamente o incremento que falta para o valor à vista se transformar no valor a pagar em um ano).
E, agora sim, podemos comparar a taxa ao se “investir” no pagamento à vista (33,3%) com a taxa referência de 30%: como ela é maior, a decisão financeiramente racional é realmente comprar a TV pelo preço à vista. Vendo por outro ângulo, imagine que você não acredite nisso tudo que desenvolvi e resolva guardar os R$ 7.500 que poderiam ser usados para quitar a TV à vista. Em um ano, ao investir esse montante a 30%, ele evolui para R$ 9.750 e você terá de inteirar R$ 250, provando que a decisão de postergar o pagamento foi ruim.
Agora no início do ano, nos deparamos com uma série de compromissos anuais para os quais temos a possibilidade de pagar a prazo (na maioria das vezes, parcelado) ou à vista com desconto, tais como IPVA, IPTU, material escolar das crianças e por aí vai. A decisão de pagar à vista ou não, obviamente, só faz sentido se a pessoa estiver preparada financeiramente para poder se beneficiar dos descontos. E é nesse momento que o planejamento financeiro faz toda a diferença. Se você não tem condições de pagar nada à vista, talvez o restante desse artigo seja ineficaz e então sugiro pular para este artigo no qual listo os quatro passos para sua organização financeira (clique aqui).
Se você possui condições ou pode fazer algum esforço para pagar essas contas à vista, a conta correta precisa ser feita para a melhor tomada de decisão possível. Tomemos como exemplo o IPVA do Estado do Rio de Janeiro, que dá 3% de desconto à vista ante o parcelamento em 3 vezes com entrada. A parte “com entrada” é importante, pois faz a diferença na hora da conta e se justifica porque a primeira parcela tem o mesmo vencimento da parcela única. Lembro que, com parcelamentos, a conta matemática não é tão simples quanto no exemplo inicial deste artigo e sugiro o uso de uma calculadora financeira ou do próprio Excel. Mas o ponto é que muitos podem pensar que 3% de desconto é muito pouco e que equivalha a aproximadamente 1% ao mês (a “conta rápida”, nesse aso, é 3% divididos pelas 3 parcelas). Muitos se espantarão com o fato de esse desconto de 3% equivaler a uma taxa de investimento de 3,13% ao mês! Sim, eu disse 3,13% AO MÊS.
Talvez muitos ainda estejam incrédulos e, portanto, vou mostrar que essa taxa está correta. Suponha que o IPVA custe R$ 3.000, de forma que você pode pagar em 3 parcelas de R$ 1.000 ou “a vista por R$ 2.910 (3% de desconto, o equivalente a R$ 90). Se você pagar parcelado, significa que o saldo a ser investido seria de R$ 1.910 (ou seja, o valor à vista descontado da primeira parcela paga). Esse montante, ao ser investido por um mês a 3,13% de juros resulta em R$ 1.970 e, então, você retira R$ 1.000 para pagamento da segunda parcela, restando no investimento o montante de R$ 970. No mês seguinte, R$ 970 multiplicados por 1,0313 (fator de capitalização equivalente à taxa de 3,13%) resultam em R$ 1.000, exatamente o que você precisa para quitar a terceira e última parcela do IPVA. Os matemáticos diriam: CQD (como queríamos demonstrar).
Portanto, se a taxa de investimento equivalente ao desconto dado pelo Estado do Rio de Janeiro no IPVA é 3,13% ao mês, não resta dúvida: vale a pena pagar à vista porque nosso dinheiro não conseguirá rentabilizar sem risco numa taxa nem próxima disso (lembro que a Selic não chega a 1% bruto ao mês, ou seja, ainda tendo de descontar o imposto de renda a ser pago). Em outros estados, o desconto no IPVA chega a ser ainda maior que no Rio de Janeiro, de modo que vale ainda mais a pena pagar à vista.
Já no caso do IPTU, o desconto varia de cidade para cidade por se tratar de um imposto municipal. Mas a minha dica é: em geral, vale muito a pena pagar à vista. Os descontos são calculados exatamente para beneficiar o pagamento à vista, caso contrário, a maioria esmagadora pagaria parcelado. E no dia a dia, quando a loja oferecer o parcelamento no cartão de crédito, pergunte por descontos à vista: em geral, qualquer descontinho já equivalerá uma taxa de investimento bastante atraente. E lembre-se de jamais deixar seu cérebro boicotar as suas finanças: evite “contas rápidas”! Fonte: Extra Globo