David Fincher volta aos cinemas com o sensacional ‘O Assassino’

O gatilho é quando, num plano de contingência aparentemente rotineiro, seu empregador opte por eliminar o assassino, em um ataque que termina por ferir a mulher com quem ele divide o lado “normal” de sua vida (papel de Sophie Charlotte). O paradoxo surge quando ele retroage esse ataque para estancar o sangramento em sua vida profissional, uma faxina internacional no que se torna seu trabalho mais pessoal – e que, ainda assim, ele insiste em manter-se emocionalmente desconectado.

Assim como o fez em “Quarto do Pânico”, suspense hitchcockiano com Jodie Foster e Jared Leto, “O Assassino” traz Fincher experimentando seu cinema em um gênero estabelecido, no caso o thriller neo-noir. Não existe, portanto, a armadilha sedutora em desconstruir um estilo. Pelo contrário: o cineasta se atém às suas regras e faz um trabalho de imersão, reinterpretando as convenções sob sua ótica e criando um produto único e estonteante em sua beleza.

Essa personalidade vem do ritmo imposto por Fincher, uma cadência glacial que nos transforma em cúmplices do assassino, já que toda a história ocorre em seu ponto de vista. Estamos a seu lado quando ele usa seu arsenal intelectual para ligar pontos e caçar seus inimigos, como se estivesse perseguindo uma sombra de si mesmo. A banalidade de toda a operação nos coloca em uma zona de conforto, multiplicando o impacto da explosão de violência.

Engana-se, contudo, quem imagina que “O Assassino” tenha alguma semelhança com, por exemplo, “John Wick”. O mundo aqui é menos artificial ou fetichizado, e quando o matador precisa usar de suas inegáveis habilidades de combate, o resultado não é um balé coreografado (ainda que plasticamente impecável), e sim um confronto de brutalidade desconcertante.

A escolha de Michael Fassbender como o assassino mostra a habilidade de Fincher em escancarar o óbvio. Assim como Michael Douglas, Brad Pitt ou Ben Affleck, avatares perfeitos para os personagens do diretor, Fassbender traz não só a frieza no olhar mas também uma aura de mistério. Um olhar para ele e não sabemos sua procedência ou do que seria capaz de fazer.

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