Cotado para ser o chanceler da Argentina caso o peronista Sergio Massa ganhe as eleições no país, o diplomata Gustavo Pandiani diz que Lula não teve nenhuma interferência na campanha e que publicitários ligados ao PT que viajaram a Buenos Aires para ajudar o candidato foram contratados apenas por suas capacidades técnicas.
“É uma equipe que por acaso nasceu no Brasil, mas poderiam ter nascido também na Colômbia, na China ou no Paquistão. São especialistas em redes […], não foram contratados pela origem de seu passaporte”, afirmou ele nesta terça (10), após entrevista coletiva a meios internacionais para divulgar o plano de governo do atual ministro da Economia na área.
Questionado, o hoje embaixador da Argentina na Suíça também negou que o presidente brasileiro tenha atuado para liberar ajuda ao país vizinho no CAF (Banco de Desenvolvimento da América Latina), como publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo. “A CAF é uma instituição que não depende da opinião de nenhum presidente, e não houve nenhuma gestão de Lula nem de ninguém chegado a ele para isso acontecesse.”
Ele procurou a todo tempo opor o programa de Massa, que seria “pragmático”, ao do ultraliberal e líder nas pesquisas Javier Milei, “ideológico”, nas palavras dele. “Não estamos entendendo por que estão falando que não teremos relações com Brasil e China, que os mercados que se resolvam. Isso vai levar a um desastre para a Argentina”, defendeu, citando o impacto nas pequenas e médias empresas.
Ele se referia ao discurso que Milei proferiu em agosto, ao criticar a entrada da Argentina no Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), alguns dias depois de ser o candidato mais votado nas eleições primárias no país —que não elegem ninguém, mas medem a temperatura do pleito.
“Eu não disse que vamos deixar de comercializar com China ou Brasil, o que estou dizendo é que isso é uma questão do setor privado na qual eu não tenho que me meter”, afirmou o libertário, que também declarou que “não se alinharia com comunistas”, mas apenas com Estados Unidos e Israel.
Pandiani ressaltou que os brasileiros e chineses concentram 30% das exportações argentinas. “Os outros candidatos dizem ‘Brics não’ só porque o governo diz ‘Brics sim’. E por que dizemos ‘Brics sim’? Porque nessa mesa estão […] os três países mais importantes para a nossa produção e exportação”.
E soltou uma frase de efeito: “Em mais 30 anos de diplomacia aprendi algo: se você não está na mesa, provavelmente está no menu”. Com mestrado em Harvard, o diplomata trabalha no Ministério das Relações Exteriores do país há 33 anos, tendo ocupado o cargo de subsecretário para América Latina e Caribe. Já atuou nos EUA (Atlanta), Jamaica, Barbados e outros países caribenhos.
Ele também disse que a relação entre Argentina e Brasil é “indestrutível” e não foi rompida “nem com [o ex-presidente Jair] Bolsonaro”; opôs-se às falas de Milei de que sairia do Mercosul caso fosse eleito —apesar de membros da equipe do libertário já terem suavizado as declarações. Defendeu o bloco como um espaço estratégico, mas admitiu que é preciso modernizá-lo.
Sergio Massa coloca um peso grande em sua política externa como forma de conseguir os dólares que a Argentina tanto precisa para pagar sua dívida com o FMI (Fundo Monetário Internacional) e aumentar suas reservas de divisas. A alta demanda e baixa oferta da moeda americana é um dos impulsionadores da inflação, que já ultrapassa os 120% anuais e é uma das mais altas do mundo.
Para isso, Pandiani explica que vai priorizar três pilares: primeiro, mais exportações de produtos com valor agregado (e não manufaturas, incluído o setor do lítio, do qual a Argentina tem uma das maiores reservas globais). Depois, mais investimentos estrangeiros e, em terceiro lugar, mais turismo. Não detalhou, porém, como vai fazer para atrair os investidores a um país devedor e economicamente instável.
A principal aposta de Massa são investimentos nos setores energético, mineiro e agropecuário para inverter a balança comercial. Do outro lado, Milei pretende fazer uma abertura unilateral ao comércio internacional, eliminando os impostos sobre exportações e importações num projeto que duraria 35 anos.