O dragão chinês envelhecido – 18/09/2023 – Por quê? Economês em bom português

Muitas vezes as pessoas se surpreendem ao estudar a história econômica mundial e descobrir que ali por volta do século 14 a China possuía uma economia bem mais avançada tecnologicamente que seus pares na Europa, inclusive na capacidade de construção naval.

Em um período relativamente curto de tempo, no entanto, o dragão se recolheu à montanha para hibernar. Cem anos mais tarde, a Europa avançava em velocidade crescente e expandia seu domínio mundial. A explicação? Os historiadores, como os economistas, aparentemente não chegaram a um consenso. Mas a tese mais forte é que a dinastia dominante simplesmente resolveu abandonar a via do progresso. Deliberadamente, voltou-se para uma espécie de clausura doméstica. Para reencontrar identidade? Para impedir que o poder central se dispersasse?

Muitos séculos depois, no começo do 21, eis que o dragão sai da caverna imbuído de certo espírito de mercado e de iniciativa privada, solta o berro e cospe fogo esquentando a temperatura de economias a milhares de milhas náuticas de distância. Em particular, acende as fornalhas no Brasil, na época dos governos Lula 1 e 2. Perde alento na época do Dilma 1 e parte do Temer, dá um gás extra no começo do Bolsonaro e então percebe o inevitável: que até para ele, todo poderoso, a idade chega. Ninguém quer envelhecer, mas no caso já não há opção: com uma renda por habitante próxima à brasileira, a China não tem como crescer mais a passos de lebre. Os 8% médios de 20 anos atrás vão virar 3% ou 4% nos 20 vindouros. Pior, nesse período de taxas supersônicas de expansão do PIB, a economia acumulou muitos desequilíbrios, e quem assim o faz dificulta a entrada na terceira idade.

O modelo canônico de crescimento econômico inventado ali na metade dos anos 1950 tem uma lição importante que sobrevive até hoje: crescer rapidamente torna-se cada vez mais difícil à medida que se vai acumulando maquinário, construindo infraestrutura, movendo a população para centros urbanos, oferecendo mais e melhor educação. É a famigerada –e o adjetivo aqui se encaixa bem– lei dos retornos marginais decrescentes. Empiricamente se traduz no fato de uma massa significativa de países ficar ali presa numa renda por habitante entre US$ 15 mil e US$ 25 mil dólares, com enorme dificuldade para se graduar para o grupo de cima.

Para piorar o prognóstico no caso do nosso dragão, nenhum país sob regime político fechado conseguiu chegar lá. É um fato. Todos os que seguiram para o pelotão da elite são democracias, onde as pessoas têm liberdade para fazer o que bem entenderem –inovar, tomar riscos, especializar-se no que curte fazer, comunicar-se com o mundo sem barreiras nem vigilância etc.

Isso tudo para dizer que o que estamos vendo em 2023 –a economia chinesa crescendo a taxas modestas– deverá ser a regra daqui em diante, não a exceção. Tentar inflar artificialmente o mercado de imóveis é sempre uma opção, mas dada a já enorme capacidade ociosa em termos de metros quadrados desocupados, seria insistir num caminho perigoso e ineficaz. As consequências para a economia brasileira? Nada boas.

Correntemente, 30% das exportações brasileiras se dirigem à China. Há 20 anos, esse número era 5%! Apesar de nosso setor exportador ser pequeno como proporção da economia doméstica, um espirro do dragão pode sim nos pôr de cama com uma pneumonia. Nossos trabalhos estatísticos sugerem que o PIB brasileiro é muito dependente do crescimento das importações chinesas.

Finalmente, como minimizar o impacto adverso? Primeiro passo: não tentar evitá-lo totalmente, pois não funciona. Nada de acionar BNDES, inventar subsídios, gastos extras. Segura o timão com firmeza e aguenta. Se a inflação doméstica declinar bastante, os juros se reduzem. O segundo passo (improvável, dado o viés ideológico do governo) é tocar a agenda de reformas com mais vigor para gerar uma melhora de expectativas quanto ao futuro e assim prevenir uma queda mais forte dos investimentos.


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