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Ilan Pappé em seu livro Dez Mitos de Israel considera a fundação do movimento sionista de Theodor Herzl como um desses mitos para justificar a fundação de um Estado judeu na Palestina como resposta ao antissemitismo europeu.

Há uma narrativa muito cômoda quando se utiliza o “antissemitismo” para atacar qualquer pessoa que defenda a causa Palestina, que se oponha à colonização imposta por Israel nesses 74 anos. Judeus se entendem como os povos originários, autênticos, nativos, e os palestinos são os invasores, os estranhos, estrangeiros, usurpadores.

Sobre a pretensa autenticidade do povo judeu e seu direito inaliável sobre o território palestino convém ler a obra A invenção do povo judeu de Schlomo Sand, na qual o autor desmonta o mito de que Israel do presente, criado em 1948, é uma pura continuidade de Israel antigo. Sand demonstra que tal reivindicação é um produto do movimento sionista do século XIX que teve em Theodor Herzl o maior ideólogo, idealizador e militante da causa.

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Significado do antissemitismo

Importante destacar o significado de antissemitismo – muito atrelado aos judeus, usado em suas narrativas, no entanto, no dicionário etimológico encontramos a seguinte definição: semita – indivíduos dos semitas, família etnográfica e linguística originária da Ásia ocidental, e que compreende os hebreus, os assírios, os aramaicos, os fenícios e os árabes.

O nome vem de Sem, um dos filhos de Noé, ancestral do povo semita. Ser antissemita também seria dizer ser contra muçulmanos e cristãos, pois Noé está presente nas três religiões monoteístas e, portanto, nos livros sagrados de todos esses povos.

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Os que lutam pela causa palestina não são antissemitas, são anti sionistas, e não consideram Israel como dono pleno, legítimo daquelas terras, que foram colonizadas. Lutam contra a ocupação, a usurpação e o projeto colonialista e colonizador aos moldes do imperialismo do século XIX que os judeus impuseram aos palestinos com o aval de Sua Majestade.

Cabe lembrar as palavras de Judith Butler em lançamento do seu livro “Caminhos Divergente”, quando esteve no Brasil: “Em vez de afirmar que criticar Israel é antissemitismo, talvez seja mais importante saber que existem judeus que não consideram que o Estado de Israel os represente.

Na verdade, a crítica é que o Estado de Israel deveria ser um estado democrático, tratando todos os cidadãos igualmente, independentemente de sua religião e etnicidade.

Deveria ser um estado que dissolva a dominação colonial do povo palestino em Gaza e na Cisjordânia e que faz reparações honestas pelas desapropriações de cerca de 900 mil palestinos em 1948 e que ao longo dos anos se tornaram 5 milhões”.

Limpeza étnica

Concordamos que o que a Palestina vive é uma limpeza étnica desde o final do século XIX, pois o projeto sionista, que possibilitou um Estado étnico judeu em território palestino, foi resultado de um processo de colonização que teve seu ápice em 1948 com a Nakba, por meio da Resolução 181, quando a Assembleia Geral da ONU dividiu a Palestina Histórica em dois territórios, mas sem a criação do Estado da Palestina.

Desde 1967 a Faixa de Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental vivem uma limpeza étnica, nos moldes apontados por Pappé. Para nós, o que a Palestina vive é uma necropolítica, como bem pontua, o filósofo camaronês Achille Mbembe no ensaio publicado em 2006 na revista Raisons Politiques, “que a expressão máxima da soberania reside em grande medida, no poder e na capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer” e é exatamente o que vem fazendo Israel há tanto tempo.

O mundo diante da permanente tentativa de “normalizar” o Apartheid na Palestina Ocupada

Em nota de 26 de Janeiro de 2023 do Ministério das Relações Exteriores do governo Federal dá condolências pela morte de nove cidadãos palestinos pelas Forças de Segurança de Israel, durante incursão realizada nesta data supracitada em campo de refugiados na cidade de Jenin, na Cisjordânia.

Ao tentarem atacar o Dr Mady caímos naquilo que Pappé denuncia em seu livro, a (i) responsabilidade acadêmica dos intelectuais em transformar mitos em verdades, e neste ponto Charles Mady acerta como Pappé, provoca, questiona os mitos fundadores de um Estado colonialista e poderoso, que sai em defesa dos seus todas as vezes que é questionado, no entanto, não altera em nada a situação do povo palestino.

Não se pode dizer que Israel promove direitos humanos, quando os mortos são crianças, velhos, mulheres; quando ocorrem mortes diárias, violências e opressões cotidianas a qual estão submetidos um povo, sejam estes muçulmanos ou cristãos que lá vivem.

O que vemos diante dos nossos olhos é um projeto colonial racista e perverso que visa remover e desenraizar o povo palestino de sua terra e apagar seus milhares de anos de história e civilização. 

Está na hora de acadêmicos se posicionarem contra o maior apartheid da história ainda em curso. Não ao silêncio diante de holocausto palestino, diante da morte e violação de direitos que nunca chegaram.

Por mais intelectuais cultos e com visão como Charles Mady, Ilan Pappe, Judith Butler, Noam Chomsky, Shlomo Sand, entre outros. 

Francirosy Campos Barbosa | Antropóloga, docente associada ao departamento de psicologia da FFCLRP/USP, coordenadora do GRACIAS – Grupo de Antropologia em Contextos Islâmicos e Árabes, pós-doutora pela Universidade de Oxford
Samira Osman | Historiadora, docente associada de História da Ásia no curso de História da UNIFESP e do Programa de Pós-Graduação em História da UNIFESP.
* Especial para a Diálogos do Sul


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