Ozempic: o que acontece ao parar de tomar o medicamento – 07/02/2023 – Equilíbrio

Teri Parris Ford se sentiu péssima tomando Ozempic. Seu médico lhe receitou o medicamento dois anos atrás para tratar sua pré-diabetes, com bons resultados. Ford, professora de arte que tem 57 anos, viu seu A1C (nível médio de glicemia) cair e perdeu quase dez quilos em seis meses.

Mas o Ozempic lhe provocava enjôo. Nos dias em que usava o medicamento, que consiste em uma injeção no abdome, ela ficava com ânsia de vômito.

Durante algum tempo Ford tomou as doses nos dias úteis, para não desperdiçar seus fins de semana se sentindo mal. Mas ela acabou dizendo ao médico que não queria sentir enjoo com tanta frequência. Eles decidiram em conjunto que ela poderia suspender o medicamento.

Em apenas dois meses, Ford recuperou todo o peso perdido. Enquanto estava usando Ozempic, seu apetite havia praticamente sumido. É um efeito colateral comum do fármaco, autorizado inicialmente para tratar a diabetes e que agora está sendo usado “off-label” (para finalidades não contidas na bula) para emagrecimento.

Ford podia até pedir algumas fritas num almoço com amigas, mas nunca conseguia terminar uma refeição. Depois de suspender a medicação, ela comia um prato de fritas, um hambúrguer e ainda tinha vontade de pedir uma sobremesa.

“Eu estava insaciável”, diz Ford. “Pensei ‘meu Deus, o que está acontecendo? Sinto fome o tempo todo.’ Fiquei chocada com a rapidez com que aconteceu.”

O médico lhe prescreveu medicamentos adicionais para controlar sua glicemia, mas, procurando perder o peso a mais outra vez, ela acabou usando Ozempic outra vez.

O Ozempic e outro medicamento, Wegovy, contêm semaglutida, que regula a glicemia e a insulina. A substância também reduz o apetite e leva o estômago a se esvaziar mais lentamente, provocando mais saciedade em menos tempo. Esses medicamentos ganharam popularidade crescente nos últimos 12 meses, devido a seu efeito emagrecedor.

As pessoas que os tomam para controlar a diabetes, porém, além daquelas que os usam principalmente para controlar seu peso, suspender a medicação de repente pode ter consequências. Os médicos querem que os pacientes tenham consciência dessas consequências.

Alguns pacientes que experimentam o fármaco optam por parar de tomá-lo, mas há cada vez mais pessoas que pararam simplesmente porque não conseguem mais encontrá-lo. O Ozempic e Wegovy estão há meses na lista do FDA (agência reguladora de drogas e alimentos dos EUA) de medicamentos “escassos”. O Trulicity, outro medicamento contra a diabetes que pode produzir perda de peso, entrou para a mesma lista em dezembro.

Andrew Kraftson, professor clínico na divisão de metabolismo, endocrinologia e diabetes da Michigan Medicine, dz que está sobrecarregado de mensagens de pacientes com obesidade ou diabetes querendo saber onde conseguir sua próxima dose e como fazer sem o remédio.

Perguntamos a alguns médicos o que ocorre no cérebro e corpo quando uma pessoa suspende o uso desses medicamentos.

O índice glicêmico sobe

Janice Jin Hwang, chefe da divisão de endocrinologia e metabolismo na Escola de Medicina da Universidade da Carolina do Norte, afirma que os pacientes provavelmente levariam cerca de uma semana para notar os efeitos de parar de usar Ozempic ou Wegovy.

“Como qualquer medicamento, quando você para de tomar, ele para de funcionar”, aponta Robert Gabbay, diretor científico e médico da Associação Americana de Diabetes. Quando as pessoas suspendem repentinamento o uso da semaglutida, o nível de glicose em seu sangue pode subir muito, diz Gabbay.

Os pacientes diabéticos podem apresentar visão embaçada, fadiga, sede e micção excessivos –possivelmente os sintomas que os levaram a receber o diagnóstico de diabetes originalmente. Alguns podem acabar na sala de emergência por exaustão com frequência, afirma Gabbay, devido a picos de glicemia. Podem também ficar mais suscetíveis a candidíases e outras infecções fúngicas ligadas a um índice glicêmico mais elevado.

Hwang afirma que médicos frequentemente experimentam outros tratamentos para controlar a glicemia de pacientes diabéticos, como metformina ou insulina. Mas interromper medicamentos pode deixar pacientes e médicos desorientados quando procuram traçar um plano de ação.

Os desejos alimentares voltam

A semaglutida imita a ação do hormônio peptídeo semelhante a glucagon 1 (GLP-1), que produzimos no intestino e que diz ao corpo que estamos saciados. O medicamento afeta o cérebro por atenuar os sinais de fome e deixar as pessoas indiferentes à comida, ou até mesmo com aversão a ela.

“A pessoa não fica pensando em comida o tempo todo”, pontua Kraftson. “Simplesmente passa a ter pouco interesse por ela.”

Isso é “altamente libertador” para alguns pacientes, diz ele. Mas, quando o paciente para de tomar o medicamento, esses efeitos cognitivos se desfazem rapidamente. No caso de alguns, afirma o profissional, basta esquecer uma dose do medicamento para eles sentirem mais fome.

“As pessoas dizem que sentem os desejos alimentares fortes voltando”, comenta Hwang. Após semanas ou meses sem Ozempic ou Wegovy, muitos voltam a ganhar peso.

Um estudo publicado na primavera e financiado pela Novo Nordisk, a empresa que fabrica o Ozempic e Wegovy, estudou pessoas que tomaram semaglutida uma vez por semana por 68 semanas e então pararam. Após um ano, elas havia recuperado dois terços do peso perdido.

Médicos relatam já ter constatado o mesmo tipo de efeito em seus pacientes.

“Tenho pacientes que perderam 22 quilos. Eles param de tomar o remédio por um mês, e quando voltam à clínica, já recuperaram nove quilos”, conta Kraftson.

Os efeitos colaterais diminuem

Em alguns casos, quando as pessoas interrompem o uso do medicamento, percebem que vinham sofrendo efeitos colaterais com a semaglutida, diz Kraftson, como dores de cabeça e dores abdominais leves. Para essas pessoas, deixar de tomar a medicação pode ser um alívio.

Lee Levin, 67, começou a usar Ozempic para controlar sua diabetes tipo 2, mas sentia náuseas tão intensas que chegou a ter que ir à sala de emergência hospitalar. Ela contou que assim que parou de tomar o remédio, aquele enjôo quase constante sumiu “quase imediatamente”.

As pessoas que, após uma interrupção, voltam a tomar a dose completa, ao invés de aumentar gradualmente, podem apresentar efeitos colaterais ainda piores num primeiro momento, pontua Kraftson, incluindo vômitos e diarreia.

Ele alerta também que os pacientes precisam seguir todas as orientações desde quando iniciam o medicamento, como mastigar devagar e evitar alimentos pesados, para não sentirem tanta saciedade que provoque enjôo.

Tradução de Clara Allain

Deixe um comentário