Com uma lista dividida entre apostas certeiras e surpresas, o Globo de Ouro anunciou nesta segunda os indicados do que pode ser sua cerimônia de redenção. À frente na ala de cinema, “Os Banshees de Inisherin” teve oito menções, seguido por “Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo”, com seis. Em TV, “Abbott Elementary” teve cinco.
Os vencedores desta 80ª edição serão conhecidos em 10 de janeiro, num retorno da cerimônia à emissora NBC, que não a exibiu neste ano devido a uma série de escândalos que chacoalhou as estruturas da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood, que entrega o troféu.
Os últimos meses foram de reclusão, cancelamento de festas, admissão de novos votantes, discursos pró-diversidade e reformulação de políticas para barrar qualquer suspeita de falta de ética ou compra de votos, situações das quais o Globo vinha sendo acusado.
Na seleção, as surpresas e ausências notáveis estão dentro das excentricidades que sempre marcaram a instituição. Por outro lado, os pontos fora da curva tendem, pela primeira vez, a contemplar um leque mais diverso de artistas.
Para uma organização que está sob escrutínio, entre vários outros motivos, porque não tinha negros no quadro de membros, caíram bem várias das indicações de atuação em cinema. Em atriz de drama, Viola Davis, de “A Mulher Rei”, aparece no páreo junto com a cubana Ana de Armas, que não foi barrada pelas críticas negativas de “Blonde”. Em ator, Jeremy Pope certamente bagunçou as expectativas para a temporada de prêmios, com o drama gay “The Inspection”.
O mexicano Diego Calva, de “Babilônia”, aparece na corrida de ator de comédia, que em sua versão feminina contemplou a malaia Michelle Yeoh, de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”. Entre os coadjuvantes, foram indicados nomes que aparecem como possibilidades ainda distantes para o Oscar, como Angela Bassett, de “Pantera Negra: Wakanda para Sempre”, a filipina Dolly De Leon, de “Triângulo da Tristeza”, e o vietnamita Ke Huy Quan, também de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”.
É sinal de que os tempos podem estar mudando. Não necessariamente no Globo de Ouro, mas na indústria, que investiu pesadamente em várias produções nas quais esses nomes aparecem. O papel da premiação foi simplesmente assimilar, coisa que não se mostrava disposta a fazer até estar cercada por polêmicas.
Vale dizer que as aparentes mudanças, no entanto, não chegaram ao prêmio de melhor direção, que, como de praxe, não incluiu mulheres. “Women Talking”, “Ela Disse” e “Passagem”, três dramas com diretoras mulheres à frente, ancorados em fortes interpretações femininas e sobre temas indissociáveis de seu universo, praticamente inexistem no Globo de Ouro.
Incongruências absurdas sempre foram a marca da premiação, e seu sistema que divide dramas de comédias ou musicais é mais uma vez um estoque de trapalhadas.
Na corrida de filme de drama estão “Avatar: O Caminho da Água”, “Os Fabelmans”, “Tár”, “Top Gun: Maverick” e “Elvis”. A cinebiografia de Elvis Presley, cheia de canções, não pareceu adequada para a categoria de comédia ou musical. Estaria tudo bem, não fossem as indicações a “Babilônia”, “Os Banshees de Inisherin” e “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” na seção vizinha.
Há uma mistura de comédia e drama nas três, mas o humor só é mesmo central nos outros dois títulos que completam o quinteto, “Glass Onion: Um Mistério Knives Out” e “Triângulo da Tristeza”.
O que deveria ser uma categoria para contemplar, digamos, filmes bons mas menos pretensiosos, como a comédia romântica “Ingresso para o Paraíso”, acabou por virar uma lista de gente elogiada, embora não suficientemente para chegar a melhor drama. Um prêmio de consolação que, na prática, exclui comédias e musicais em sua essência.
Algo semelhante acontece em televisão, que pôs a aflitiva “O Urso” entre as séries de comédia, ao lado de títulos que de fato fazem rir. Nesse setor, é interessante notar que, por seu calendário descolado daquele seguido pelo Emmy, o Globo de Ouro pôde contemplar títulos com pegada pop que estrearam após
a mais importante premiação da televisão americana.
São elas “Casa do Dragão”, em drama, “Wandinha” e a própria “O Urso”, em comédia, e “Black Bird” e “Dahmer: Um Canibal Americano”, em minissérie. A segunda temporada de “The White Lotus”, atualmente sendo incansavelmente elogiada em meio à sua finale, também concorre em minissérie, já que ali ficam também as séries antológicas, isto é, com uma narrativa diferente a cada temporada.
A derivada de “Game of Thrones”, aliás, foi o único esforço pomposo das plataformas de streaming ao longo do ano a aparecer no páreo para melhor série de drama. “Andor”, do Disney+, “Stranger Things” e “Sandman”, da Netflix, e “O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder”, do Amazon Prime Video, foram preteridos por “Better Call Saul”, “The Crown”, “Ozark” e “Ruptura”.
Em comédia, além de “O Urso” e “Wandinha”, aparecem ainda “Hacks”, “Only Murders in the Building” e a campeã de indicações “Abbott Elementary”. Em minissérie, “Dahmer”, “Black Bird” e “The White Lotus” enfrentam “The Dropout” e “Pam & Tommy”.
Confira a lista completa de indicados