Após o Banco Central (BC) facilitar as regras para portabilidade de conta-salário em 2018, o número de solicitações quintuplicou, mas a maioria ainda é negada pelos bancos contratados pelos empregadores, segundo dados da Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP).
O relatório da CIP, empresa controlada por bancos e que operacionaliza a portabilidade, foi obtido pelo Estadão/Broadcast e mostra ainda que a maior parte das recusas ocorre por motivos simples, como problemas no CPF ou CNPJ informados.
As solicitações pela instituição de destino para transferir a conta-salário saltaram de 998 mil, em 2018, para 5,3 milhões em 2021. Em 2022 até maio, já foram 2,9 milhões de pedidos. No total, desde 2018, o número de requisições chega a 15,5 milhões.
Desse volume, 7,4 milhões de solicitações foram reprovadas de julho de 2018, quando a regra efetivamente entrou em vigor, até maio deste ano – ou 48% do total no período (15,4 milhões).
Foram aprovadas 7 milhões (45%) e 868 mil tiveram aceitação compulsória (6%), que ocorre automaticamente quando acaba o prazo para análise do banco de origem. Houve ainda 149 mil pedidos cancelados pela instituição de destino (1%).
Esse é mais um assunto que opõe bancos tradicionais e os entrantes, como instituições de pagamento e bancos digitais. Enquanto representantes dos “novatos” querem mudanças no processo, com uma proposta de fazer a portabilidade pelo Pix, os bancos tradicionais gostariam que as regras anteriores a 2018 fossem retomadas.
Naquele ano, o BC permitiu que a solicitação de portabilidade fosse feita também ao banco de destino, e não apenas à instituição contratada pelo empregador. Além disso, possibilitou que a transferência fosse realizada para contas de pagamento, além de contas-depósito.
Vista como elemento central para aumentar a competitividade no sistema financeiro, a portabilidade da conta-salário é de interesse das instituições de pagamentos e bancos digitais, que atuaram ativamente pelas mudanças das regras em 2018. Mas, passados quatro anos e diante da alta rejeição dos pedidos, essas instituições querem mais, sobretudo porque há uma avaliação de que os motivos dados para as negativas são divergências de informações e derivados da burocracia do processo.
Erros
Segundo o BC, o pedido de portabilidade só pode ser recusado se houver algum erro no procedimento da solicitação, como um dado pessoal incorreto, ou em caso de desistência do cliente.
Entre as razões para as rejeições listadas na apresentação da CIP, a maior é “CNPJ do empregador não encontrado” (41% dos casos), algo que pode acontecer, por exemplo, porque o cliente não sabe ao certo o registro da empresa que trabalha.
A segunda é “CPF não encontrado” (23%) e a terceira, “CNPJ e CPF divergentes” (18%). A desistência do cliente – que pode ocorrer, por exemplo, por melhores condições oferecidas pelo banco atual – soma 520 mil casos (7%). Responde por 3% dos motivos de reprovação quando a conta informada não permite transferência (201 mil).
Entre os bancos tradicionais, a mudança da regra não foi bem-recebida, com o argumento junto ao BC que abriria margem para fraudes. As instituições financeiras defendem que se retorne ao modelo antigo, em que o cliente precisa solicitar ao banco em que recebe salário a portabilidade da conta.
Entre o fim do ano passado e o começo deste ano, houve, de acordo com fontes do setor, um pico de fraudes em que criminosos abriam contas em fintechs, utilizando documentos falsos e, em seguida, pediam a portabilidade do salário do verdadeiro titular do documento, que só descobria o crime depois. O maior alvo eram servidores públicos.
O assunto chegou ao conhecimento do BC, que chegou a sinalizar mudanças nas regras. No entanto, a ocorrência desse crime caiu sensivelmente. Uma fonte destaca que, agora, a maior parte dos crimes utiliza a chamada engenharia social: os bandidos passam por instituições financeiras, seja na internet ou por telefone, para obter recursos de forma ilícita. Passam ao largo, portanto, da portabilidade de salário.
Procurada, a CIP não se pronunciou. O Banco Central também afirmou que não iria se manifestar.
Fonte: Estadão/Broadcast