Em um país em que 26% da população tem acima de 50 anos, as oportunidades de emprego para essa faixa etária ainda são restritas. Em muitas empresas, a participação desse grupo não ultrapassa os 10% do time, conforme estudo da plataforma de realocação Maturi e da EY Brasil.
De olho nesse descompasso e na escassez de mão de obra especializada, companhias como PepsiCo, Delloite, Credicard, Banco Neon e Kimberly Clark desenvolvem programas para aumentar a diversidade etária de suas equipes.
Com o aumento da idade de aposentadoria (62 anos para mulheres e 65 anos para homens) e uma expectativa de vida cada vez maior, as pessoas vão precisar ficar mais tempo no mercado de trabalho. Intitulada “Por que pessoas 50+ não são consideradas como força de trabalho em um país que envelhece?”, a pesquisa mostra que 57% dos trabalhadores terão mais de 45 anos em 2040.
Para absorver esse contingente de mão de obra sênior, as empresas terão de criar políticas consistentes para reduzir barreiras à entrada e manutenção desse profissionais no mercado. Hoje há uma dificuldade crescente para a geração madura se inserir no mercado de trabalho exatamente por causa do etarismo e dos avanços tecnológicos.
“Aquilo que se propaga sobre habilidade em tecnologia é em parte verdade. As pessoas maduras utilizam as tecnologias, mas falta entender um pouco mais o que são essas tecnologias. Não precisa se tornar um programador, mas vale pesquisar mais a fundo o que é o metaverso, por exemplo”, diz o diretor de diversidade, equidade e inclusão da Deloitte, José Marcos da Silva, coautor do livro Revolução 50+.
Etaristas
Segundo a pesquisa da Maturi e EY, as próprias empresas reconhecem que são etaristas. Quase 80% delas afirmam que existe um viés contrário a profissionais mais experientes. Mas o presidente da Maturi, Mórris Litvak, afirma que, aos poucos, a situação começa a mudar pela necessidade. Com a alta rotatividade dos profissionais, algumas empresas passaram a enxergar a responsabilidade, o comprometimento e a inteligência emocional como um diferencial dos 50+.
Além disso, as organizações estão de olho no consumidor da chamada economia prateada, que também está em alta. Para alcançar esse público, é preciso entender as suas necessidades. “Por isso, é fundamental ter profissionais que saibam se comunicar e desenvolver produtos para esse público”, diz Litvak, responsável pela implementação de projetos, consultorias e treinamentos ligados ao tema em empresas como Credicard, Banco Neon e Kimberly Clark.
Habilidades
Ter um time diverso, que consegue pensar em várias possibilidades e mercados, virou um grande trunfo para as empresas alcançarem um público cada vez maior. Nesse cenário, algumas habilidades dos profissionais acima de 50 anos passaram a ser vistas como estratégicas para os negócios. Na lista de competências estão comprometimento, inteligência emocional e experiência.
“Os funcionários mais maduros têm entre suas características poder de persuasão, passam mais confiança e desenvolvem uma comunicação mais assertiva com os clientes devido à bagagem de vida”, afirma o presidente da CotaFácil, Ismael Dias. Segundo ele, a empresa está em processo de contratação de dez trabalhadores acima de 50 anos para atuar na área de televendas de consignados, cujos clientes são dessa faixa etária.
Hoje com 120 colaboradores, a maioria entre 18 e 35 anos, a companhia quer equilibrar o quadro com mais diversidade etária e inclusão. “Profissionais com mais de 50 anos já conhecem seus pontos fortes e fracos, suas habilidades de comunicação estão mais apuradas e podem ser bons líderes por causa do tempo no mercado de trabalho.” Além disso, diz o executivo, esses profissionais são mais comprometidos com a empresa, trazem uma cultura corporativa e diminuem a rotatividade.
Essas também são as características que movem a fundadora e diretora financeira da rede de academias Red Fitness, Ellen Fernandes, em busca de profissionais mais velhos. A empresa já tem uma participação relevante em algumas áreas, como nos cargos de gestão, em que 90% dos funcionários estão nessa faixa etária. Entre os treinadores físicos, no entanto, a representatividade cai para 10%.
“O mercado de trabalho, principalmente o fitness, busca inovação ao mesmo tempo que quer experiência e profissionais com inteligência emocional, que é fundamental para conviver com o estresse do cotidiano e atuar com trabalhos em equipe.” No geral, afirma Ellen, profissionais mais velhos são mais responsáveis nas entregas, sem a necessidade de o líder ficar monitorando de perto o dia a dia.
Cultura
Com uma agenda sólida de iniciativas voltadas ao tema de diversidade e inclusão, a PepsiCo criou o programa Golden Years. O objetivo é combater o etarismo, abrindo espaço para profissionais com mais de 50 anos. Hoje, mais de mil pessoas (cerca de 8,3% do time) na empresa são dessa faixa etária e estão alocadas em todos os níveis e áreas. Segundo a empresa, a rotatividade desse público é 49% menor; o absenteísmo, 27% mais baixo; e o engajamento, 3% superior.
“Para todas as nossas oportunidades, buscamos e valorizamos talentos que tenham habilidades e soft skills que vão além da técnica e possam agregar conhecimento com experiências profissionais e pessoais”, afirma Fábio Barbagli, vice-presidente de RH da PepsiCo Brasil. “Profissionais 50+, especificamente, trazem uma bagagem de experiências que para nós é muito valiosa.”
Troca produtiva
Outra empresa que apostou nos profissionais acima de 50 anos foi o Grupo Águia. Para o projeto de Copa do Mundo, que reúne Stella Barros, Top Service, Gray Line, Lynx Aviação e 4BTS, a diretora de cultura, Agatha Abrahão, conta que foram contratados seis coordenadores, todos com mais de 50 anos. “Eles têm skills fortes de operações de grandes eventos, com um currículo imenso de experiência em Copas do Mundo e no Panamericano”, destaca a executiva. “Precisa de uma visão muito abrangente de cenários e riscos. Tem de ter uma escola muito forte.”
Ela conta que, a exemplo do que ocorre no projeto, a diversidade etária sempre foi orgânica no grupo. A heterogeneidade do time acaba criando uma mentoria informal entre os mais velhos e os profissionais mais jovens. “Os 50+ também veem a oportunidade de aprendizagem com os mais jovens. É uma troca produtiva.”