A adoção de um novo algoritmo no Sisu (Sistema de Seleção Unificada) é defendida por pesquisadores para evitar que cotistas sejam prejudicados por notas de corte mais elevadas.
Como mostrou a Folha, o problema atinge um em cada quatro cursos no Sisu, e 5,2% das vagas reservadas para ações afirmativas.
Em evento nesta terça-feira (10), o pesquisador do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) Adriano Senkevics também defendeu outras mudanças na Lei de Cotas, que tem uma revisão prevista para este ano.
Doutor em educação pela USP, ele apresentou um conjunto de propostas elaboradas em parceria com a economista Ursula Mello, pesquisadora do Institute for Economic Analysis (IEA) de Barcelona.
As opiniões não representam necessariamente a visão do Inep sobre o tema.
Além da introdução do algoritmo do Sisu, eles defendem: a exigência de o aluno ter cursado também parte do ensino fundamental em escola pública para ter direito às cotas, e não só o ensino médio; impedir o acesso a elas por alunos de escolas públicas que não tenham ingresso aberto a toda a população, como exemplo colégios militares; e ainda atualizar o parâmetro de referência da população de pretos, pardos e indígenas.
Na apresentação, Senkevics mostrou que a implantação das ações afirmativas conseguiu ampliar de forma considerável a diversidade nas universidades, especialmente entre pretos, pardos e indígenas, e de forma particularmente incisiva nos cursos mais concorridos.
De 2012, quando a lei foi aprovada, a 2016, quando terminou seu prazo de implementação, a participação de estudantes de escola pública aumentou 15% nas federais, e a de pretos pardos e indígenas egressos dessas escolas subiu ainda mais, 39%.
Por outro lado, o pesquisador apontou consequências indesejadas do mecanismo de aplicação da legislação. Entre elas está justamente o mecanismo do Sisu de permitir ao aluno escolher apenas uma modalidade de cota, o que resulta em uma parcela de notas de cortes maiores do que as de ampla concorrência —apontado na reportagem da Folha.
Para evitar o problema, Senkevis e Mello propõe mecanismo previsto em estudo dos economistas Inácio Bó e Orhan Aygün. A ideia é que, ao se inscrever em vagas reservadas, todos os que têm determinadas características possam competir por aquelas vagas.
Hoje, um estudante preto, com deficiência, baixa renda e egresso de escola pública, pode se inscrever por qualquer modalidade de cota e toma essa decisão de forma estratégica, com base na atualização das notas de corte ao longo do período de inscrição.
O grupo mais prejudicado por esse mecanismo, como a Folha mostrou, é o de estudantes de escola pública que não se enquadram em outro critério de ação afirmativa. Essa é a modalidade de cota em que, com mais frequência, a nota de corte é maior do que a exigida de alunos de colégios particulares.
A outra proposta apresentada nesta terça-feira, de exigir também que o aluno tenha cursado ao menos os anos finais de ensino fundamental em escola pública, tem como contexto estudo de Mello.
Ela mostrou que, após a Lei de Cotas, aumentou em 31% o número de alunos que migra da escola pública para a particular entre o nono ano do ensino fundamental e o primeiro do médio, o que indica uma transferência movida pela intenção de se beneficiar da ação afirmativa.
Além disso, a dupla de pesquisadores defende que estudantes formados em escolas que selecionam os alunos de alguma forma não sejam beneficiados pela política.
Estudo de Cláudio Nogueira na UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) mostrou que os egressos de escolas de ensino médio federais passaram de 19,5% na universidade, em 2012, para 33,1% em 2015, três anos após a lei.
A dupla defende ainda a atualização do parâmetro populacional para a população negra. Atualmente, o cálculo das cotas é feito em cima da proporção de pretos, pardos e indígenas em cada estado, segundo o Censo de 2010.
Pesquisas posteriores, porém, têm apontado um crescimento desses grupos, devido a diversos fatores, como uma maior valorização da negritude. A Pnad de 2016, por exemplo, aponta que 54,1% da população pertence a um desses três grupos, enquanto no Censo de 2010 a taxa é de 47,5%.