'Como se fosse The Walking Dead, só que ao vivo', relata sobrevivente de duas enchentes no RS


Família foi afetada por catástrofes climáticas em setembro e maio no município de Estrela. Tragédia ambiental destruiu casas e empreendimentos. Casa em Estrela abrigou 80 pessoas em enchente de setembro
O cenário de lama, casas destruídas e destroços por todos os lados deixados pelas enchentes no RS vão ficar pra sempre na memória de Gabriela Barbosa, moradora de Estrela, no Vale do Taquari.
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“A cena que a gente viu depois que a água baixou era como se fosse o The Walking Dead, só que ao vivo e a cores. Os carros abandonados no meio da estrada, tudo destruído… a minha casa, eu moro ali há 32 anos. Destruiu tudo”, relembra.
Nesta semana, a primeira enchente vivenciada por Gabriela completou 1 ano. No dia 4 de setembro de 2023, a região foi atingida por chuvas intensas, que destruíram cidades e deixaram mais de 50 mortes.
Naquela época, Gabriela e sua família estavam viajando quando receberam o alerta de que uma enchente estava a caminho da região onde moram. A empresária, o namorado e os dois filhos –Nicolas, de 3 anos, e Ísis, de 1 – voltaram ao município para cuidar do imóvel, situado no bairro Moinhos.
“Quando a água começou a entrar, a situação se tornou desesperadora. Tentamos elevar nossos pertences, mas sem muita esperança,” lembra Gabriela.
Eles se refugiaram na casa da mãe da empresária, que, devido à localização mais alta, abrigou cerca de 80 pessoas, dentro e em cima da residência, já que a água alcançou o pátio do local.
Moradores de Estrela (RS) ficaram ilhados e tiveram suas casas invadidas pela água na enchente de setembro
Arquivo pessoal
A enchente de setembro elevou o Rio Taquari à cota de 29 metros, 10 metros acima do limite de inundação e 16 metros acima do normal. Ao todo, 54 pessoas morreram e quatro seguem desaparecidas. Em Estrela, duas mortes foram confirmadas (veja mapa abaixo).
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A enchente causou dívidas à família de Gabriela. Além da casa, eles também perderam a confeitaria, um prejuízo total de cerca de R$ 200 mil.
“A máquina de fazer pastel, os maquinários, a batedeira, a mercadoria, os docinhos, os salgados, destruiu tudo”, relembra.
A reconstrução foi um desafio. A casa foi restaurada com a ajuda de amigos, parentes e vizinhos. Contudo, o trauma da enchente foi tão profundo que Gabriela e sua família decidiram comprar um mercado no bairro das Indústrias, distante do rio, onde colocaram a confeitaria como parte do negócio.
“Eu me desesperei, não queria mais passar por isso de novo. Então apareceu a oportunidade de a gente comprar o mercado. Começamos a trabalhar, deu tudo certo… até a enchente de maio”, conta.
Nova enchente em maio
A tragédia se repetiu em maio de 2024, mas com uma intensidade mais forte. Desta vez, 183 pessoas morreram em todo o estado, sendo 47 no Vale do Taquari.
Quando a água começou a invadir o município, Gabriela estava trabalhando no mercado. O local comprado pela família em uma localização longe do rio estava prestes a ser inundado pelas fortes chuvas.
A prioridade era clara: tirar os produtos de dentro do estabelecimento. Em 15 minutos, Gabriela conseguiu um caminhão com a ajuda de um parente para tirar os balcões da confeitaria, a geladeira e muitas mercadorias.
“Muita coisa ficou dentro do mercado. Eu sei que quando nós saímos com o caminhão, a água começou a entrar”, recorda.
Padaria do mercado de Gabriela Barbosa ficou destruída na enchente de maio, em Estrela (RS)
Arquivo pessoal
O mercado ficou devastado. No entanto, com a ajuda de conhecidos, em 15 dias o empreendimento já estava aberto novamente.
Já a casa da família, que tinha sido reformada depois da enchente de setembro, ficou pior ainda com as cheias de maio. A água ultrapassou o teto do imóvel, ou seja, não era possível enxergar a residência.
Casa em Estrela foi destruída pela enchente de maio
A família foi forçada a se mudar temporariamente para a casa de um familiar enquanto procuravam um novo lar. Atualmente, mora em outra residência em Estrela.
“Hoje o Nicolas diz assim ‘minha casa pegou a enchente’ e ele chora. Acho que ele sentiu tudo o que a gente sentiu, ele viu tudo. A gente passa por lá e ele diz ‘ó, aqui a enchente levou'”, conta a mãe.
Gabriela Barbosa com o namorado e os filhos, Nicolas e Ísis
Arquivo pessoal
De acordo com a empresária, não é possível voltar para a antiga casa devido ao estado de devastação. Ela afirma que vai buscar indenização da propriedade.
Gabriela ainda relata que a situação financeira da família ficou comprometida.
“A gente trabalha hoje só pra pagar conta, dívidas que ficaram da enchente de setembro e da enchente de maio”, diz Gabriela. “Se contar só eu, meu namorado, meus sogros e minha mãe, passa mais de um milhão de dívidas que a gente gerou das nossas casas, dos nossos empregos”, completa.

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